domingo, 22 de abril de 2012

Espelho, espelho meu, quem sou eu?


Espelho, espelho meu, quem sou eu?

Vik Muniz - Narciso


Ainda está em cartaz o filme “Mirror, Mirror” (Espelho, Espelho Meu), baseado num dos contos mais famosos dos irmãos Grimm: “Branca de Neve e os Sete Anões”. É ao espelho que a madrasta má faz suas perguntas.

O espelho está presente na vida cotidiana, pode ser na simples representação física do objeto - na decoração de nossas casas, dos prédios residenciais e comerciais, nas lojas e shoppings, cinemas e teatros, nas alegorias carnavalescas, nos elevadores e halls, nas ruas e banheiros públicos 

Ou nos símbolos que trazem referências passadas. É o espelho que leva Alice para um de seus mundos mágicos. 




É um tema privilegiado da filosofia e da mística. Forte é sua presença, mais intensa ainda é sua simbologia. É um paradoxo dentro de nós, porque revela e oculta, sensibiliza e choca, aponta e camufla.





Espelho, espelho meu, quem sou eu?

John Derian - Mirror


Muitas pessoas se relacionam com outras como uma espécie de espelho. Nesta relação espelhada,  a mola que impele o meu ser é o outro porque, de alguma maneira, quero atingi-lo, ou me sinto atingida por ele. 

Quando o outro me incomoda



Temos em nossa essência o céu e o inferno, anjos e demônios, o bem e o mal que aguardam nossas escolhas e opções. Enquanto não conhecermos este inferno, este lado obscuro ou sombrio, jamais ele será céu porque não sairemos dele.

Na realidade, o que me incomoda no outro não é ele, mas o que está dentro de mim. É uma reação de reflexo. 

Enxergamos nas pessoas tudo àquilo que gostamos e não gostamos em nós mesmos. Se estas partes estiverem bem resolvidas em nós, seremos capazes de ver os outros como eles realmente são e não como uma projeção nossa.

Como não podemos ver a nós mesmos, precisamos de um espelho para nos enxergar: “Você é meu espelho e eu sou o seu.”


O convívio


Do mesmo modo que as coisas têm um valor, um preço, as pessoas também têm um valor que é a dignidade. Se eu não me relacionar comigo mesmo corro o risco de perder meu valor de gente, minha dignidade, e receber um valor conforme minha utilidade.

Quanto melhor for a relação que desenvolvo comigo mesmo, mais sinto que existe dentro de mim algo que vale a pena e que posso confiar. Nessa relação de nós com a gente mesmo elevamos a autoestima, investimos em nós e desenvolvemos relacionamentos saudáveis em que pode haver dois. 

Portanto, antes de conviver com o outro precisamos poder conviver com a gente mesmo. Léa Michaan


Para a relação ser criativa e saudável




“É importante que eu esteja consciente do clima emocional e mental que ronda em mim (mau humor, ódio, sentimento de inferioridade, inveja, raiva, dependência, enfim, sentimentos negativos) para não contaminar o relacionamento, pelo menos não em demasia”. Léa Michaan

“Para estar consciente e poder me relacionar livre disso com a outra pessoa preciso me relacionar comigo mesmo: percebendo-me, mantendo um dialogo interno, distinguindo o que é meu e o que é do outro e abrindo a consciência para estar lúcido e perceber se me irrito com o outro, ou com algo que ele faz ou diz, ou se a irritação já estava dentro de mim, e eu uso o outro como desculpa para explicar a minha irritação.
Se algo que ele diz me irrita ou me deixa zangado, é porque se engancha em algo que está em mim. O que o outro diz e me incomoda, na realidade só despertou um sentimento quanto a mim mesmo que já me incomodava, e que eu não tratei.
Se a pessoa foi rude, grosseira, insensível. Isto é problema dela, afinal, por que eu ficaria tão incomodada com o outro que é grosseiro?
Se enganchar em mim, a solução é me analisar e conhecer meus ganchos. A melhor maneira para resolver esta relação é pensando no que acontece comigo e não naquilo que esta ruim com o outro”. Léa Michaan


Afinal, só é possível mudar algo em mim, e é inútil ter a pretensão de modificar o outro. Bater na mesma tecla dizendo e redizendo sobre o que o outro tem que mudar é pura perda de tempo e não leva a nada. Léa Michaan é psicóloga

Mas temos o livre arbítrio e a capacidade de mudar, de tecer nossa vida de maneira bela e criativa

Liliana Porter – arte de bolso

como fez “A Moça Tecelã”

Por Marina Colasanti
Acordava ainda no escuro, como se ouvisse o sol chegando atrás das beiradas da noite. E logo se sentava ao tear.
Linha clara, para começar o dia. Delicado traço cor da luz, que ela ia passando entre os fios estendidos, enquanto lá fora a claridade da manhã desenhava o horizonte.
Depois lãs mais vivas, quentes lãs iam tecendo hora a hora, em longo tapete que nunca acabava.

Se era forte demais o sol, e no jardim pendiam as pétalas, a moça colocava na lançadeira grossos fios cinzentos  do algodão  mais felpudo. Em breve, na penumbra trazida pelas nuvens, escolhia um fio de prata, que em pontos longos rebordava sobre o tecido. Leve, a chuva vinha cumprimentá-la à janela.
Mas se durante muitos dias o vento e o frio brigavam com as folhas e espantavam os pássaros, bastava a moça tecer com seus belos fios dourados, para que o sol voltasse a acalmar a natureza.
Assim, jogando a lançadeira de um lado para outro e batendo os grandes pentes do tear para frente e para trás, a moça passava os seus dias.
Nada lhe faltava. Na hora da fome tecia um lindo peixe, com cuidado de escamas. E eis que o peixe estava na mesa, pronto para ser comido. Se sede vinha, suave era a lã cor de leite que entremeava o tapete. E à noite, depois de lançar seu fio de escuridão, dormia tranqüila.
Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.
Mas tecendo e tecendo, ela própria trouxe o tempo em que se sentiu sozinha, e pela primeira vez pensou em como seria bom ter um marido ao lado.
Não esperou o dia seguinte. Com capricho de quem tenta uma coisa nunca conhecida, começou a entremear no tapete as lãs e as cores que lhe dariam companhia. E aos poucos seu desejo foi aparecendo, chapéu emplumado, rosto barbado, corpo aprumado, sapato engraxado. Estava justamente acabando de entremear o último fio da ponto dos sapatos, quando bateram à porta.
Nem precisou abrir. O moço meteu a mão na maçaneta, tirou o chapéu de pluma, e foi entrando em sua vida.
Aquela noite, deitada no ombro dele, a moça pensou nos lindos filhos que teceria para aumentar ainda mais a sua felicidade.
E feliz foi, durante algum tempo. Mas se o homem tinha pensado em filhos, logo os esqueceu. Porque tinha descoberto o poder do tear, em nada mais pensou a não ser nas coisas todas que ele poderia lhe dar.
— Uma casa melhor é necessária — disse para a mulher. E parecia justo, agora que eram dois. Exigiu que escolhesse as mais belas lãs cor de tijolo, fios verdes para os batentes, e pressa para a casa acontecer.
Mas pronta a casa, já não lhe pareceu suficiente.
— Para que ter casa se podemos ter palácio? — perguntou. Sem querer resposta imediatamente ordenou que fosse de pedra com arremates em prata.
Dias e dias, semanas e meses trabalhou a moça tecendo tetos e portas, e pátios e escadas, e salas e poços. A neve caía lá fora, e ela não tinha tempo para chamar o sol. A noite chegava, e ela não tinha tempo para arrematar o dia. Tecia e entristecia, enquanto sem parar batiam os pentes acompanhando o ritmo da lançadeira.
Afinal o palácio ficou pronto. E entre tantos cômodos, o marido escolheu para ela e seu tear o mais alto quarto da mais alta torre.
— É para que ninguém saiba do tapete — ele disse. E antes de trancar a porta à chave, advertiu: — Faltam as estrebarias. E não se esqueça dos cavalos!
Sem descanso tecia a mulher os caprichos do marido, enchendo o palácio de luxos, os cofres de moedas, as salas de criados. Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.
E tecendo, ela própria trouxe o tempo em que sua tristeza lhe pareceu maior que o palácio com todos os seus tesouros. E pela primeira vez pensou em como seria bom estar sozinha de novo.
Só esperou anoitecer. Levantou-se enquanto o marido dormia sonhando com novas exigências. E descalça, para não fazer barulho, subiu a longa escada da torre, sentou-se ao tear.
Desta vez não precisou escolher linha nenhuma. Segurou a lançadeira ao contrário, e jogando-a veloz de um lado para o outro, começou a desfazer seu tecido. Desteceu os cavalos, as carruagens, as estrebarias, os jardins.  Depois desteceu os criados e o palácio e todas as maravilhas que continha. E novamente se viu na sua casa pequena e sorriu para o jardim além da janela.
A noite acabava quando o marido estranhando a cama dura acordou e, espantado, olhou em volta. Não teve tempo de se levantar. Ela já desfazia o desenho escuro dos sapatos, e ele viu seus pés desaparecendo, sumindo as pernas. Rápido, o nada subiu-lhe pelo corpo, tomou o peito aprumado, o emplumado chapéu.
Então, como se ouvisse a chegada do sol, a moça escolheu uma linha clara. E foi passando-a devagar entre os fios, delicado traço de luz, que a manhã repetiu na linha do horizonte.


Meu coração espelha meu eu através do meu olhar 
e das minhas ações.
Maria Célia

Veja o lindo vídeo: http://youtu.be/g1CVhWr7SaU















11 comentários:

  1. A gente passa muito tempo pela vida sem perceber como o Universo em sua perfeição infinita nos dá tudo que precisamos para crescer, de uma forma precisa.Fugimos léguas de nos olhar nos espelhos que a vida nos oferece a cada dia porque lá no fundo sabemos que ali vamos enxergar a nós mesmos... Quando despertamos para o fato de que os acontecimentos ao nosso redor e as pessoas também, são espelhos para partes nossas que não conseguimos enxergar, isso faz uma diferença enorme.

    A partir de então agradecemos ao Universo quando nos deparamos com coisas que nos incomodam, porque sabemos que ali, ao invés de incomodo, existe na verdade uma chave para que a gente se conheça mais um pouco... Não podemos mudar o outro... mas, sempre podemos transformar em nós o que nos incomoda no outro e isso muda tudo ao nosso redor.

    Rubia Dantés

    Acho este este pequeno trecho de um texto da Rubia, encaixa perfeitamente com a seu post! Beijo grande Maria Célia, Boa semana cheia de inspirações e luz! bjs :)

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    1. Sheila, também achei perfeito o texto de Rubia Dantés, principalmente quando ela cita a chave para o conhecimento pessoal. Somos capazes de contagiar as pessoas ao nosso redor porque estamos carregados de energia e a troca é mútua. Atraímos, como um ímã, o que nos é afim. Agradeço ao Universo as pessoas que me rodeiam e que me fazem tão bem.

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  2. “Se pudéssemos ver-nos como os outros nos vêem
    Ou como veriam se estivessem a par de tudo
    Uma reforma geral seria inevitável
    Seria impossível, de outro modo, suportar a visão”
    Adam Smith

    Sejamos como somos, sempre nos observando e sempre observando a nossa volta, aceitando os erros e limitações e buscando sempre melhorar daqui e dali.

    E Salve Jorge!

    Beijos passarinha :)

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    1. Tina,
      Somos singulares. Orai e Vigiai é uma necessidade a todo o momento. Estamos aqui para melhorar e “consertar” nossas imperfeições que não são poucas. São Jorge nos abençoe!

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  3. Lindo.....estamos nos reciclando a cada dia, e eu mais que ninguem vigio os meus atos, que muitas vezes me desconheço....otima semana e grande abraço

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  4. Dia a dia tento me ver com mais clareza e com mais tolerância no espelho, que é o meu próximo (pais, irmãs, sobrinhas, amigas...). Essa tolerância (comigo mesma - o reflexo)está me ajudando a seguir em frente em minha caminhada, em minha busca, em minha jornada... Estou muito mais serena, mais tranquila e mais produtiva. E que o caminho continue aberto para mais conquistas.
    Beijos e obrigada por mais essa lição.
    Jô.

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  5. Olá amiga, precisamos nos ver. Bonito o que você disse. Lacek nos ajudou muito, Eveline também. Beijocas e saudade.

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  6. Bom dia Maria Célia!

    Que postagem especial. Como é bom ter a chance de acordar e ler textos significativos como esses. Reler Marina Colasanti - que privilégio.

    Ultimamente eu tenho "sentido" a frase "... o que me incomoda no outro não é ele, mas o que está dentro de mim..." como algo real. Eu lia muito sobre isso e achava muito legal, mas eu não "sentia". Hoje eu sinto, e compreendo e tenho consciência o quão real isso é. Acho que isso se chama maturidade, crescimento, e eu gosto muito dessa sensação.
    Muito boa mesmo essa postagem, parabéns.

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    1. Regina,
      Senti falta dos seus comentários.
      Esta fase de que você fala é a “individuação”, representa a jornada do ego em busca do Self.
      “Em geral, é o processo de constituição e particularização da essência individual... e é, portanto, um processo de diferenciação cujo objetivo é o desenvolvimento da personalidade individual... e é uma necessidade natural” (in Tipos Psicológicos, pág. 525, 4ª Ed. Zahar Editores)
      É isso que você definiu tão bem: maturidade e crescimento.
      Beijocas.

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  7. Todos tem capacidade de mudar mas precisam querer de verdade, beijo Lisette.

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  8. Bom dia Maria Célia. Estou passando rapidinho (dia atarefado) para lhe desejar um ótimo final de semana, e também para curtir um pouquinho das lindas músicas que você tem por aqui :)

    abraços

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